Alexy e sua teoria dos princípios
INTRODUÇÃO
Faremos agora uma breve exposição da teoria alexiana dos princípios. Veremos, primeiro, como Alexy define o conceito de norma jurídica, distinguindo entre regras e princípios como dois tipos de norma. Depois, veremos as diferenças que Alexy aponta nos modos de aplicação de regras e princípios. Finalmente, veremos como Alexy descreve o procedimento de ponderação de princípios e o papel que atribui à proporcionalidade
1. Conceito de norma jurídica
No tempo em que Alexy escreveu sua "Teoria dos direitos fundamentais", em 1986, os estudiosos do direito não duvidavam mais nem da existência nem da força normativa dos princípios. No entanto, a definição de norma com que trabalhavam, que falava de condição de fato e conseqüência jurídica, era visivelmente adequada apenas para regras, deixando em suspenso como os princípios poderiam ser normas se não se encaixavam naquela definição. Por isso, fazia falta uma definição de norma que fosse capaz de abarcar tanto as regras quanto os princípios, definição que Alexy anunciou ter encontrado na sua "definição formal" de norma
Alexy retomou a velha tradição de definir a norma como um enunciado de obrigação, permissão e proibição. Usando termos da lógica jurídica, disse que qualquer enunciado que tivesse esses "operadores deônticos" - obrigatório, permitido, proibido - é classificável como norma. Assim, as regras e os princípios seriam normas, na medida em que ambos podem ser formulados com uso dos operadores deônticos.
2. Regras e princípios
Contudo, trata-se de dois tipos distintos de norma. Regras são "mandamentos definitivos", quer dizer, que ordenam fazer uma coisa numa medida previamente definida. Princípios, por outro lado, são "mandamentos de otimização", ou seja, ordenam fazer uma coisa na máxima medida possível. Assim, regras são normas cuja medida de aplicação já vem previamente definida, enquanto princípios são normas cuja medida de aplicação deve ser definida, pelo julgador, em cada situação de aplicação.
O limite até onde deve ser realizada a coisa enunciada pelo princípio é aquele ponto a partir do qual se estaria sacrificando outro pincípio mais importante. Assim, os princípios podem entrar em conflito uns com os outros e o que limita a realização de um princípio é a necessidade de realização de algum outro princípio mais importante. Por isso, os princípios, ao contrário das regras, devem ser sempre aplicados levando em consideração uns aos outros, do contrário se torna impossível definir a medida de aplicação que devem receber em casa caso
3. Modo de aplicação
Como conseqüência dessa definição de regras e princípios, decorrem diferenças quanto ao modo de aplicação de um e de outro. Essas diferenças são duas:
a) Regras são aplicadas por subsunção, princípios são aplicados por ponderação. Regras são estruturadas na forma da conexão condição de fato - conseqüência jurídica, de modo que a toda situação que caia sob a condição de fato descrita pela norma deve ser aplicada a conseqüência jurídica prescrita pela norma. Princípios, ao contrário, não indicam previamente nem a que situações de aplicam (condição de fato) nem de que forma devem ser aplicados a elas (conseqüência jurídica). Por isso, devem ser aplicados por ponderação, quer dizer, identificando se se referem à situação em questão e avaliando o peso relativo que têm para aquela situação em comparação com outros princípios incidentes.
b) Conflitos entre regras seguem a lógica do tudo ou nada, enquanto colisões entre princípios seguem a lógica do mais ou menos. Se um mesmo caso se subsume a duas regras inconciliáveis entre si, então ou se cria uma cláusula de exceção a uma delas que lhe permita conviver com a outra ou se exclui uma delas do ordenamento jurídico. Por outro lado, se dois princípios colidem em certa situação, a ponderação definirá no máximo qual deles terá precedência (prevalência, primazia) para o caso, mas nem excluirá o outro do ordenamento jurídico nem afastará por completo sua aplicação para aquela mesma situação.
4. Ponderação e proporcionalidade
A ponderação de princípios, no entanto, deve seguir um procedimento próprio. Esse procedimento contém três passos, que estão em relação aos três elementos da proporcionalidade. É que Alexy destaca a proporcionalidade, que tinha sido considerada até então como um princípio entre outros, dando a ela o papel de ser uma condição de aplicação dos princípios. Ou seja, em última instância, a ponderação nada mais é que a aplicação da proporcionalidade às possíveis soluções para as colisões de princípios em cada caso concreto.
A proporcionalidade é, segundo Alexy, informada por três máximas: (A) Adequação: a solução de uma colisão de princípios é adequada quando realiza o mandamento de pelo menos um dos princípios envolvidos. (B) Necessidade: a solução de uma colisão de princípios é necessária se realiza o mandamento de um dos princípios envolvidos com o menor sacrifício possível dos outros princípios envolvidos. (C) Proporcionalidade em sentido estrito: uma solução é proporcional se dá precedência ao princípio que, em vista das circunstâncias do caso concreto, tem de fato mais peso.
A solução que atender ao mesmo tempo às máximas de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito deve ser vertida na forma de uma regra de precedência condicionada, quer dizer, de uma regra que enuncia que, dadas certas circunstâncias, o princípio tal deve prevalecer sobre o princípio tal. Portanto, a forma de uma regra de precedência condicionada é: "Toda vez que estiverem presentes as circunstâncias C1, C2, C3 etc., o princípio P1 deve ter precedência sobre o princípio P2".
5. Conclusões
Casos que envolvem princípios não são decididos por princípios, e sim por uma regra: a regra de precedência condicionada. O fato de ela ser condicionada, quer dizer, de ela enunciar sob quais condições a precedência deve ocorrer, impede que existam princípios absolutos - que tivessem sempre precedência sobre os demais - e garante a universalidade da regra - pois todos os casos que reunirem aquelas mesmas condições deverão observar aquela mesma precedência.
Contudo, a regra de precedência condicionada é uma regra judiciária, e não legislativa. Por isso, diferentemente do que ocorre com as outras regras, não conta com o apoio do princípio da legalidade nem pode ter sua aplicação posterior feita por simples subsunção. A regra de precedência é uma decisão in casu, que só pode ser invocada para a solução de novos casos da mesma maneira que o são os precedentes judiciais, e não as regras jurídicas.
Faremos agora uma breve exposição da teoria alexiana dos princípios. Veremos, primeiro, como Alexy define o conceito de norma jurídica, distinguindo entre regras e princípios como dois tipos de norma. Depois, veremos as diferenças que Alexy aponta nos modos de aplicação de regras e princípios. Finalmente, veremos como Alexy descreve o procedimento de ponderação de princípios e o papel que atribui à proporcionalidade
1. Conceito de norma jurídica
No tempo em que Alexy escreveu sua "Teoria dos direitos fundamentais", em 1986, os estudiosos do direito não duvidavam mais nem da existência nem da força normativa dos princípios. No entanto, a definição de norma com que trabalhavam, que falava de condição de fato e conseqüência jurídica, era visivelmente adequada apenas para regras, deixando em suspenso como os princípios poderiam ser normas se não se encaixavam naquela definição. Por isso, fazia falta uma definição de norma que fosse capaz de abarcar tanto as regras quanto os princípios, definição que Alexy anunciou ter encontrado na sua "definição formal" de norma
Alexy retomou a velha tradição de definir a norma como um enunciado de obrigação, permissão e proibição. Usando termos da lógica jurídica, disse que qualquer enunciado que tivesse esses "operadores deônticos" - obrigatório, permitido, proibido - é classificável como norma. Assim, as regras e os princípios seriam normas, na medida em que ambos podem ser formulados com uso dos operadores deônticos.
2. Regras e princípios
Contudo, trata-se de dois tipos distintos de norma. Regras são "mandamentos definitivos", quer dizer, que ordenam fazer uma coisa numa medida previamente definida. Princípios, por outro lado, são "mandamentos de otimização", ou seja, ordenam fazer uma coisa na máxima medida possível. Assim, regras são normas cuja medida de aplicação já vem previamente definida, enquanto princípios são normas cuja medida de aplicação deve ser definida, pelo julgador, em cada situação de aplicação.
O limite até onde deve ser realizada a coisa enunciada pelo princípio é aquele ponto a partir do qual se estaria sacrificando outro pincípio mais importante. Assim, os princípios podem entrar em conflito uns com os outros e o que limita a realização de um princípio é a necessidade de realização de algum outro princípio mais importante. Por isso, os princípios, ao contrário das regras, devem ser sempre aplicados levando em consideração uns aos outros, do contrário se torna impossível definir a medida de aplicação que devem receber em casa caso
3. Modo de aplicação
Como conseqüência dessa definição de regras e princípios, decorrem diferenças quanto ao modo de aplicação de um e de outro. Essas diferenças são duas:
a) Regras são aplicadas por subsunção, princípios são aplicados por ponderação. Regras são estruturadas na forma da conexão condição de fato - conseqüência jurídica, de modo que a toda situação que caia sob a condição de fato descrita pela norma deve ser aplicada a conseqüência jurídica prescrita pela norma. Princípios, ao contrário, não indicam previamente nem a que situações de aplicam (condição de fato) nem de que forma devem ser aplicados a elas (conseqüência jurídica). Por isso, devem ser aplicados por ponderação, quer dizer, identificando se se referem à situação em questão e avaliando o peso relativo que têm para aquela situação em comparação com outros princípios incidentes.
b) Conflitos entre regras seguem a lógica do tudo ou nada, enquanto colisões entre princípios seguem a lógica do mais ou menos. Se um mesmo caso se subsume a duas regras inconciliáveis entre si, então ou se cria uma cláusula de exceção a uma delas que lhe permita conviver com a outra ou se exclui uma delas do ordenamento jurídico. Por outro lado, se dois princípios colidem em certa situação, a ponderação definirá no máximo qual deles terá precedência (prevalência, primazia) para o caso, mas nem excluirá o outro do ordenamento jurídico nem afastará por completo sua aplicação para aquela mesma situação.
4. Ponderação e proporcionalidade
A ponderação de princípios, no entanto, deve seguir um procedimento próprio. Esse procedimento contém três passos, que estão em relação aos três elementos da proporcionalidade. É que Alexy destaca a proporcionalidade, que tinha sido considerada até então como um princípio entre outros, dando a ela o papel de ser uma condição de aplicação dos princípios. Ou seja, em última instância, a ponderação nada mais é que a aplicação da proporcionalidade às possíveis soluções para as colisões de princípios em cada caso concreto.
A proporcionalidade é, segundo Alexy, informada por três máximas: (A) Adequação: a solução de uma colisão de princípios é adequada quando realiza o mandamento de pelo menos um dos princípios envolvidos. (B) Necessidade: a solução de uma colisão de princípios é necessária se realiza o mandamento de um dos princípios envolvidos com o menor sacrifício possível dos outros princípios envolvidos. (C) Proporcionalidade em sentido estrito: uma solução é proporcional se dá precedência ao princípio que, em vista das circunstâncias do caso concreto, tem de fato mais peso.
A solução que atender ao mesmo tempo às máximas de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito deve ser vertida na forma de uma regra de precedência condicionada, quer dizer, de uma regra que enuncia que, dadas certas circunstâncias, o princípio tal deve prevalecer sobre o princípio tal. Portanto, a forma de uma regra de precedência condicionada é: "Toda vez que estiverem presentes as circunstâncias C1, C2, C3 etc., o princípio P1 deve ter precedência sobre o princípio P2".
5. Conclusões
Casos que envolvem princípios não são decididos por princípios, e sim por uma regra: a regra de precedência condicionada. O fato de ela ser condicionada, quer dizer, de ela enunciar sob quais condições a precedência deve ocorrer, impede que existam princípios absolutos - que tivessem sempre precedência sobre os demais - e garante a universalidade da regra - pois todos os casos que reunirem aquelas mesmas condições deverão observar aquela mesma precedência.
Contudo, a regra de precedência condicionada é uma regra judiciária, e não legislativa. Por isso, diferentemente do que ocorre com as outras regras, não conta com o apoio do princípio da legalidade nem pode ter sua aplicação posterior feita por simples subsunção. A regra de precedência é uma decisão in casu, que só pode ser invocada para a solução de novos casos da mesma maneira que o são os precedentes judiciais, e não as regras jurídicas.
Comentários
mas se me permite fazer algumas ponderações, gostaria de opinar no sentido de que, acredito que apesar da validade e utilidade presente na diferença quase paradigmatica,que é ontológica, que alexy faz entre regras e principios, isso porque ambos se submetem ao genero de norma, quando se trata de interpretação/aplicação, esta noção pode nos prejudicar um pouco.
isso porque, partindo de uma matriz de Gadamer, não devemos aceitar a subsunção do fato à norma ou daquele a este (principio ou regra, considerando e aceitando a existência de de uma realidade ´´por si só´´.
isso porque, tal acarretaria a separação entre o programa normativo - aqui uso expressões felizes de canotilho - considerado como o conjunto de disposições textuais positivadas, e o setor normativo, entendido este algo mais ou menos como uma noção habermasiana de faticidade.
pois bem, quando alexy se refere ao modo de aplicação de regras e principios fica bem claro que para ele, existe dentro dessas regras e principios, uma normatividade pré-instalada, e ao interprete apenas cabe analisar a situação fática, e enqudra-la dentro do campo de abrangência de determinado princípio,formando depois a ´´norma de decisão´´, e isso, caso a questão requeira o uso de principios e não puder ser resolvida no campo descritivo das regras.
pelo que parecere, alexy desconsidera a inseparabilidade entre norma e setor normativo.
digo-o porque ele submete determinado caso real a ´´aquele principio que tiver mais importancia´´ como se a normatividade já estivesse ali, pronta para ser utilizada, esquecendo ele de dizer que do texto - seja ela de uma regra ou principio - a norma só será extraida em razão da condição de ser no mundo do interprete, utilizando-se para tanto da linguagem, que portando caráter historico e cultural, determinará a relação existente entre o texto e faticidade, revelando a norma após o processo de pre-compreensão.
no mais, fico grato pela atenção
um abraço.
obs: sou anulo do 5 semestre da tarde no cesupa, turma di5ta.
Adelvan Oliverio
adelvan@globo.com
Gostaria de parabenizá-lo pelo texto. Está muito bem escrito e bastante didático. Devo dizer que finalmente entendi os três passos da ponderação de Alexy.
Atenciosamente,
Paulo Meireles Neto.