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Mostrando postagens de junho, 2009

Democracia deliberativa em sociedades com déficit de mobilização da esfera pública

É sabido que a teoria política de Habermas preconiza um tipo de democracia deliberativa em que a esfera pública – aquele espaço social de formação da opinião e da vontade em que cada um intervém e contribui na condição de cidadão – desempenha um papel central na tomada de decisões políticas e na sua legitimação procedimental. Disso resulta um desafio que tal teoria lança às sociedades latino-americanas, em que a esfera pública é tradicionalmente descrita como inexistente, incompleta, distorcida ou adormecida. Supondo que seja verdadeira a tese habermasiana de que decisões políticas só podem ser legítimas se foram produto de uma deliberação democrática por parte da esfera pública e supondo, também, que as referidas descrições desfavoráveis e pessimistas das esferas públicas das sociedades latino-americanas sejam verdadeiras, ficaria no ar a pergunta sobre como seria possível dar legitimidade procedimental a decisões políticas em contextos de profunda desmobilização e apatia política. Du

Teorias intuitivas e contraintuitivas

A fertilidade de uma teoria é inversamente proporcional à sua plausibilidade. Isso porque a plausibilidade de uma teoria nada mais é que a medida em que ela se ajusta ao senso comum (do tempo e lugar em que ela está sendo avaliada) e, portanto, a medida em que ela nada acrescenta àquilo que já se sabe ou já se pensa sobre certo assunto. Em epistemologia, é comum chamar a teoria plausível de "intuitiva". Uma teoria "intuitiva" sobre o ciúme, por exemplo, é que, quando amamos muito certa coisa, temos medo de perdê-la, entregando-nos a fantasias sobre ameaças de que tal coisa seja tomada de nós, que nos despertam antecipadamente sentimentos de medo, de raiva e de perda. Essa teoria é "intuitiva" porque não desafia nosso senso comum sobre o ciúme (nossa "folk psychology" sobre o ciúme), sendo, pelo contrário, apenas a sua explicitação conceitual. Duas teorias "intuitivas" sobre o aumento da criminalidade são a de que se trata de uma consequ

Novamente a interpretação

As teorias mais atuais da interpretação deixaram de vê-la como um processo de descoberta do sentido previamente contido num texto e passaram a vê-la como processo de atribuição de sentido ao texto, nos limites do que o texto permite. Um exemplo particularmente interessante é a da mensagem cifrada em código (bom, tecnicamente, toda mensagem é sempre cifrada em algum código, mas a expressão é geralmente reservada para códigos secretos, cuja chave de decifração é conhecida de poucos usuários). Lembro de um caso recente em que, numa conversa telefônica interceptada pela polícia e exibida no Jornal Nacional, um jogador de futebol e um traficante de drogas carioca conversavam, quando o jogador falou sobre estar precisando de um "tênis", o traficante disse que tinha dois disponíveis, o jogador perguntou onde poderia ir pegá-los e o traficante lhe pediu que passasse na sua "casa". A mensagem é, em princípio, banal. Mas, na reportagem, se dizia (com ou sem razão, aqui não ve