Sobre "Atire a primeira pedra"
Meu convicto ateísmo nunca me impediu de apreciar ensinamentos bíblicos, especialmente alguns provérbios e parábolas. Quanto ao Cristo, em que pese não considerá-lo nem Deus nem coisa que o valha, admiro-o francamente como belo exemplo de ser humano e como um grande sábio da historia universal. Hoje vou comentar uma passagem famosa, constante em João 8:7: "Que atire a pedra aquele que estiver isento de pecado".
Em primeiro lugar, considero essa uma das melhores frases da história da humanidade. Sempre admirei a sagacidade do Cristo. Como naquela vez em que os fariseus queriam jogar o povo contra ele e lhe perguntaram se deviam pagar o imposto a Roma, ao que ele respondeu, depois de ouvir que a imagem gravada nas moedas romanas era de César: "Então dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus". Resposta seca, metafórica e brilhante.
Na passagem citada, também ocorre isso. Agora os fariseus lhe trazem uma mulher apanhada em adultério e lhe pedem que a julgue conforme a lei mosaica, que exigia como pena a morte por dilapidação. Depois de abaixar-se e fazer alguns círculos com o dedo na areia, ele levanta e diz: "Pois então que atire a primeira pedra aquele que estiver isento de pecado". Nova tirada de gênio. Todos pecam, ninguém atiraria pedra alguma. Nem autorizou dilapidação, nem quebrou a lei antiga.
Pessoalmente, não estou nem aí para quem acha que esses supostos feitos do Cristo foram na verdade invenções posteriores de monges medievais espertalhões, ou ainda versões transformadas de velhas histórias de fundo moral que circulavam há séculos por toda a Ásia. Pouco importa. São frases e histórias belas, inspiradoras e ricas de sabedoria. Quem as criou e quando é o menos importante. Poderia até nem ter existido Cristo algum nem episódio algum da dilapidação. Poderia ser tudo uma lenda. Não diminuiria um centímetro do valor moral da história.
Afinal, fora o significado mais direto, a história é uma versão metafórica do "Não julgues para não seres julgado". A dilapidação é uma metáfora do julgamento, da crítica, da maledicência, da reprovação aos que erram. "Atire a primeira pedra" não é apenas uma forma de dissuasão do reprovador, mas é antes uma forma de redirigir seu juízo de reprovação contra si mesmo. "Examina-te, vê se não pecaste também", é o que ela convida a fazer. Antes de julgar ao outro, julga-te a ti mesmo.
Mas isso ainda não é tudo. Quem, numa situação assim, atiraria a primeira pedra? Podemos imaginar que, se cada um dos que lá estavam estivesse sozinho, e não numa multidão, talvez fosse hipócrita o bastante para pensar "Quem? Eu? Eu sou santo, vou mais é atirar essa pedra em cheio na adúltera". Mas não em público! Quem atirasse a primeira pedra estaria se pondo na delicada posição de não-pecador e se expondo ao escrutínio crítico de todos os demais. Estaria candidatando-se a vítima da próxima dilapidação. Como ninguém quer essa inspeção sobre seus atos, melhor não atirar pedra alguma, o que, de quebra, relembra como é incômoda a posição de ser julgado e ajuda a pecadora de uma nova maneira. É como se o Cristo dissesse: "Querem ser julgadores? Ok, desde que se disponham a ser julgados em seguida". Nada feito.
O caráter bilateral de todo julgamento e a prudência de abster-se de julgar para não ser julgado em seguida são lições inestimáveis dessa passagem singular dos Evangelhos.
Em primeiro lugar, considero essa uma das melhores frases da história da humanidade. Sempre admirei a sagacidade do Cristo. Como naquela vez em que os fariseus queriam jogar o povo contra ele e lhe perguntaram se deviam pagar o imposto a Roma, ao que ele respondeu, depois de ouvir que a imagem gravada nas moedas romanas era de César: "Então dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus". Resposta seca, metafórica e brilhante.
Na passagem citada, também ocorre isso. Agora os fariseus lhe trazem uma mulher apanhada em adultério e lhe pedem que a julgue conforme a lei mosaica, que exigia como pena a morte por dilapidação. Depois de abaixar-se e fazer alguns círculos com o dedo na areia, ele levanta e diz: "Pois então que atire a primeira pedra aquele que estiver isento de pecado". Nova tirada de gênio. Todos pecam, ninguém atiraria pedra alguma. Nem autorizou dilapidação, nem quebrou a lei antiga.
Pessoalmente, não estou nem aí para quem acha que esses supostos feitos do Cristo foram na verdade invenções posteriores de monges medievais espertalhões, ou ainda versões transformadas de velhas histórias de fundo moral que circulavam há séculos por toda a Ásia. Pouco importa. São frases e histórias belas, inspiradoras e ricas de sabedoria. Quem as criou e quando é o menos importante. Poderia até nem ter existido Cristo algum nem episódio algum da dilapidação. Poderia ser tudo uma lenda. Não diminuiria um centímetro do valor moral da história.
Afinal, fora o significado mais direto, a história é uma versão metafórica do "Não julgues para não seres julgado". A dilapidação é uma metáfora do julgamento, da crítica, da maledicência, da reprovação aos que erram. "Atire a primeira pedra" não é apenas uma forma de dissuasão do reprovador, mas é antes uma forma de redirigir seu juízo de reprovação contra si mesmo. "Examina-te, vê se não pecaste também", é o que ela convida a fazer. Antes de julgar ao outro, julga-te a ti mesmo.
Mas isso ainda não é tudo. Quem, numa situação assim, atiraria a primeira pedra? Podemos imaginar que, se cada um dos que lá estavam estivesse sozinho, e não numa multidão, talvez fosse hipócrita o bastante para pensar "Quem? Eu? Eu sou santo, vou mais é atirar essa pedra em cheio na adúltera". Mas não em público! Quem atirasse a primeira pedra estaria se pondo na delicada posição de não-pecador e se expondo ao escrutínio crítico de todos os demais. Estaria candidatando-se a vítima da próxima dilapidação. Como ninguém quer essa inspeção sobre seus atos, melhor não atirar pedra alguma, o que, de quebra, relembra como é incômoda a posição de ser julgado e ajuda a pecadora de uma nova maneira. É como se o Cristo dissesse: "Querem ser julgadores? Ok, desde que se disponham a ser julgados em seguida". Nada feito.
O caráter bilateral de todo julgamento e a prudência de abster-se de julgar para não ser julgado em seguida são lições inestimáveis dessa passagem singular dos Evangelhos.
Comentários
Foi com base na força bruta que vilipendiaram a cultura dos homens que habitavam essa terra, na base do porrete e da chibata. "Sigai meus dogmas, abraçai a minha causa, aceitai a minha fé, e vos darei o reino dos céus". Para mim foi demais. Fico com a minha Mula-Sem-Cabeça. Pelo menos ela fala a minha língua.
Todavia, para não parecer com aqueles outros, adotei o discurso do respeito às religiões. Tanto é que concordo com as tiradas de gênio esculpidas no Livro Sagrado, receita de bolo para exercer o controle das mentalidades. Quem quiser que se habilite. Mas eu não. Não mais. Nunca mais.
Sou um utilitarista. Sou um limitado. Não me incomoda se um monge budista compreende a bolsa de valores ou se isso é bom ou mal. Alguém decidiu por ele ao longo de sua vida.
Absorvo o que de bom me é servido à mesa segundo um direito inerente à própria natureza humana e quando acredito que é melhor comer nela do que no chão da submissão. As elites africanas, os aiatolás, os talebans do mundo devem ter inveja de mim. Sou um homem-bomba disfarçado de cristão. rsss...