Tragédia e História
Dedicado a Fernanda
Seguindo com os temas correlatos de minhas atuais aulas de História do Direito e do Pensamento Jurídico, que por ora se ocupam do mundo grego, abordarei hoje o tema da Tragédia ática. Bem, como se sabe, tragédia é aquele gênero literário e teatral em que se conta a história de um herói ou de uma heroína de grande destaque social e de grande virtude que, após cometer um erro fatal, voluntário ou involuntário, desencadeia uma série de infortúnios terríveis contra si e contra aqueles que ama, tendo como desfecho a loucura ou a morte desse herói ou dessa heroína. São exemplos paradigmáticos de tragédia o Édipo-Rei e a Antígona, de Sófocles, a Orestéia, de Ésquilo, a Electra e a Medéia, de Eurípides, o Rei Lear e o Júlio César, de Shakespeare etc. Segundo a abordagem clássica, o propósito da tragédia seria despertar intensos sentimentos de medo e piedade, para em seguida proporcionar uma catarse de tais sentimentos, acompanhada do maravilhamento diante das personagens e do enredo. Uma boa tragédia deve apresentar seu herói ou sua heroína de modo tal que o público possa identificar-se com ele, pois é isso que garantirá que o público acompanhe a peripécia, isto é, a sequência terrível e incontrolável de infortúnios, compadecendo-se dele ou dela pelo que já aconteceu (piedade) e temendo por ele ou por ela quanto ao que virá em seguida (medo). Na tragédia, o momento final, em que ocorre o último e mais grave e irreversível dos eventos da peripécia, é o momento em que medo e piedade se fundem e atingem um nível tal de intensidade que causa o arrebatamento emocional da platéia, mas é também o momento em que, assumindo o herói a responsabilidade por seus infortúnios, libera-se a piedade, que é substituída por certo alívio e reconforto (afinal, não se trata de uma perseguição irracional do destino contra o herói, mas de uma cadeia de consequências de suas próprias escolhas) e por certa sensação de força e potência (afinal, pela confissão de sua culpa, o herói se torna de vítima em causador dos eventos e retoma sua posição de domínio e responsabilidade pelo próprio destino) e, chegando a cadeia trágica ao seu desfecho fatal (em que nada de mais terrível ainda poderá vir a ainda ocorrer e, portanto, não se tem mais nada a temer, como se o destino, ao desferir seu golpe mais duro e fatal, se tornasse inofensivo, porque, esgotado seu arsenal, restou incapaz de produzir a expectativa de fazer algo ainda mais terrível), libera-se o medo. A tragédia, especialmente a tragédia grega, se apresenta, assim, como cenário propício para a discussão acerca da virtude e do excesso (afinal, o herói trágico ou a heroína trágica só experimenta a grande desgraça porque possui grande virtude, sendo, nesse caso, a grande desgraça uma consequência aparentemente natural e uma recompensa aparentemente injusta de sua grande virtude, ao mesmo tempo que é testemunho dela, porque ninguém medíocre e desimportante seria objeto de uma peseguição tão violenta e impiedosa do destino) e acerca do poder da liberdade e da impotência perante o destino (afinal, o herói trágico cai em desgraça contra a sua vontade, mas ao mesmo tempo por causa de suas ações, de modo que, se experimenta, por um lado, toda a peripécia com o horror e o desespero de quem não consegue controlar nem deter um ciclo de desgraças uma vez desencadeado, tendo, assim, a mais profunda experiência de impotência, experimenta, por outro lado, o momento de reconhecimento de sua culpa com o horror e ao mesmo o conforto de quem finalmente compreendeu por que tudo aquilo era de fato inevitável e com o orgulho de quem encontrou em si a força propulsora de seu próprio destino trágico, tendo, assim, a mais profunda experiência de potência novamente, uma potência extrema nascida e tornada possível na impotência extrema e por causa dela). A tragédia, mais até do que opor destino inevitável e liberdade absoluta, converte o destino inevitável e a liberdade absoluta numa só e única coisa, esmagando e exaltando o homem ao mesmo tempo e através do mesmo enredo.
Seguindo com os temas correlatos de minhas atuais aulas de História do Direito e do Pensamento Jurídico, que por ora se ocupam do mundo grego, abordarei hoje o tema da Tragédia ática. Bem, como se sabe, tragédia é aquele gênero literário e teatral em que se conta a história de um herói ou de uma heroína de grande destaque social e de grande virtude que, após cometer um erro fatal, voluntário ou involuntário, desencadeia uma série de infortúnios terríveis contra si e contra aqueles que ama, tendo como desfecho a loucura ou a morte desse herói ou dessa heroína. São exemplos paradigmáticos de tragédia o Édipo-Rei e a Antígona, de Sófocles, a Orestéia, de Ésquilo, a Electra e a Medéia, de Eurípides, o Rei Lear e o Júlio César, de Shakespeare etc. Segundo a abordagem clássica, o propósito da tragédia seria despertar intensos sentimentos de medo e piedade, para em seguida proporcionar uma catarse de tais sentimentos, acompanhada do maravilhamento diante das personagens e do enredo. Uma boa tragédia deve apresentar seu herói ou sua heroína de modo tal que o público possa identificar-se com ele, pois é isso que garantirá que o público acompanhe a peripécia, isto é, a sequência terrível e incontrolável de infortúnios, compadecendo-se dele ou dela pelo que já aconteceu (piedade) e temendo por ele ou por ela quanto ao que virá em seguida (medo). Na tragédia, o momento final, em que ocorre o último e mais grave e irreversível dos eventos da peripécia, é o momento em que medo e piedade se fundem e atingem um nível tal de intensidade que causa o arrebatamento emocional da platéia, mas é também o momento em que, assumindo o herói a responsabilidade por seus infortúnios, libera-se a piedade, que é substituída por certo alívio e reconforto (afinal, não se trata de uma perseguição irracional do destino contra o herói, mas de uma cadeia de consequências de suas próprias escolhas) e por certa sensação de força e potência (afinal, pela confissão de sua culpa, o herói se torna de vítima em causador dos eventos e retoma sua posição de domínio e responsabilidade pelo próprio destino) e, chegando a cadeia trágica ao seu desfecho fatal (em que nada de mais terrível ainda poderá vir a ainda ocorrer e, portanto, não se tem mais nada a temer, como se o destino, ao desferir seu golpe mais duro e fatal, se tornasse inofensivo, porque, esgotado seu arsenal, restou incapaz de produzir a expectativa de fazer algo ainda mais terrível), libera-se o medo. A tragédia, especialmente a tragédia grega, se apresenta, assim, como cenário propício para a discussão acerca da virtude e do excesso (afinal, o herói trágico ou a heroína trágica só experimenta a grande desgraça porque possui grande virtude, sendo, nesse caso, a grande desgraça uma consequência aparentemente natural e uma recompensa aparentemente injusta de sua grande virtude, ao mesmo tempo que é testemunho dela, porque ninguém medíocre e desimportante seria objeto de uma peseguição tão violenta e impiedosa do destino) e acerca do poder da liberdade e da impotência perante o destino (afinal, o herói trágico cai em desgraça contra a sua vontade, mas ao mesmo tempo por causa de suas ações, de modo que, se experimenta, por um lado, toda a peripécia com o horror e o desespero de quem não consegue controlar nem deter um ciclo de desgraças uma vez desencadeado, tendo, assim, a mais profunda experiência de impotência, experimenta, por outro lado, o momento de reconhecimento de sua culpa com o horror e ao mesmo o conforto de quem finalmente compreendeu por que tudo aquilo era de fato inevitável e com o orgulho de quem encontrou em si a força propulsora de seu próprio destino trágico, tendo, assim, a mais profunda experiência de potência novamente, uma potência extrema nascida e tornada possível na impotência extrema e por causa dela). A tragédia, mais até do que opor destino inevitável e liberdade absoluta, converte o destino inevitável e a liberdade absoluta numa só e única coisa, esmagando e exaltando o homem ao mesmo tempo e através do mesmo enredo.
Comentários
A clareza do texto lhe é peculiar. Sem dúvida, as tragédias se reproduzem, em sentido mais restrito, no nosso cotidiano, de diversas maneiras: a) seja na perspectiva pessoal de cada um, quando se passa por momentos de crise existencial nos quais o "fundo do poço" parece possuir uma mola que reconduz à superfície (a potência trazida pelo desespero); b) seja na perspectiva social, na qual uma sociedade parece viver em constante tragégia, num movimento de gangôrra entre opostos (fundo e superfície) constante.
Às vezes, sem o glamur pertinente aos heróis trágicos, me sinto inserido numa tragédia pessoal da vida e, sempre, numa tragégia social.
Abraços,
Arthur Laércio
Criei um blog, para discutir Direito, Educação e Política (principalmente os dois primeiros).
Facarei honrado com a sua presença virtual no espaço:
http://constituindojus.blogspot.com/
Abraços,
Arthur