Pena de morte: Dica para um trabalho de ensino médio
Na já longínqua postagem "Filosofia Moral: Ética e Moral", uma das que continua rendendo comentários até hoje, uma jovem chamada Adriana me pediu, nos comentários, que revelasse minha posição sobre a pena de morte, para que ela pudesse fazer constar de um trabalho de escola que lhe havia sido passado. Eu, em vez disso, falei sobre os vários planos de questões a que eu achava que o trabalho deveria se dedicar. Como pode ser que isso tenha alguma utilidade para outra pessoa, reproduzo cá embaixo o que respondi por e-mail para Adriana.
Abaixo reproduzo o que escrevi no e-mail:
Cara Adriana,
Gostaria, inicialmente, de dar uma dica sobre a organização do trabalho: A pena de morte é um assunto para ser discutida em vários frontes distintos. Os principais planos de discussão seriam:
Plano jurídico: Seria a pena de morte permitida no Brasil? Essa pergunta tem uma resposta única e objetiva: Não, em vista do Art. 5º, XLVII, a) da CF/88. Mas nesse mesmo artigo se faz a exceção do caso de guerra declarada, desde que de acordo com lei a ser estipulada, conforme o Art. 84 da CF/88. Então, uma lei que instituísse a pena de morte para outros casos que não os de guerra declarada seria inconstitucional. Poderia ser feita uma emenda constitucional para fazer com que a pena de morte fosse permitida para outros casos? Não, em vista do Art. 60, §4º, IV, CF/88. Como a proibição da pena de morte é considerada uma das garantias individuais do direito à vida, é uma cláusula pétrea da constituição (quer dizer, uma daquelas normas que não podem ser reformadas nem mesmo por uma emenda constitucional). Conclusão: Pena de morte, no Brasil, para outros casos que não os de guerra declarada, só com outra constituição diferente da que aí está. No atual regime constitucional seria impossível, não teria lei, emenda, referendo, plebiscito que desse jeito nisso.
Plano da eficácia: Se, no entanto, a pena de morte fosse adotada no Brasil, ela funcionaria bem, no sentido de inibir a criminalidade? Aí vocês têm que examinar várias coisas. Em que países (ou, no caso dos EUA, em que estados) se adota a pena de morte? Nesses países (ou estados), quais crimes são punidos com a pena de morte? Quais requisitos precisam estar presentes para que o promotor público possa pedir "pena de morte" para o réu? Se condenado, em quanto tempo, em média, é executado? Quais são os meios de morte empregados? Houve efetiva diminuição da criminalidade depois da adoção da pena de morte? Quão parecidos ou diferentes do Brasil são esses países? Dadas as inclinações de nosso Congresso Nacional, quais seriam provavelmente os crimes punidos com pena de morte no Brasil? Dado o estado de nosso aparelho policial, judiciário e penitenciário, quem seriam as principais vítimas da pena de morte no Brasil? Será que ela seria uma medida eficiente mesmo?
Plano penitenciário: Nosso sistema penitenciário está falido. Temos um grande número de presos, um pequeno número de prisões, que se tornam superlotadas, violentas e deformadoras. São verdadeiras escolas do crime para os menos experientes e zonas de domínio e influência para os mais experientes. Muitos criminosos perigosos continuam a ser chefes do crime de dentro da prisão. Muitos saem e voltam a delinqüir. Nesse contexto, prender ainda adianta? Adiantaria se as prisões fossem em maior número e tivessem melhores condições? Mais ainda, essas prisões são dispendiosas, cada preso mantido lá custa caro aos cofres do Estado. Sendo assim, dever-se-ia gastar tanto dinheiro com essas pessoas, quando não se gasta com os que estão do lado de fora, trabalhando em vez de delinqüindo? Seria a morte um meio de reduzir esses custos e se livrar dos casos mais perigosos e irrecuperáveis? Temos o direito de fazer cálculo econômico de gastos ao tratar de vida e morte de seres humanos? A sociedade deveria empenhar todo tempo e dinheiro necessário na recuperação dos criminosos?
Plano moral: O Estado tem o direito de matar? Qual o objetivo da pena: punir, prevenir ou recuperar? Se for punir, a morte não é uma punição desproporcional, porque irreversível? Se for prevenir, de que modo a morte inibe de cometer crimes as pessoas que vivem constantemente sob a ameaça da violência e, portanto, também da morte? Se for recuperar, de que modo a morte haveria de recuperar alguém? Contudo, que punição seria proporcional ao crime que tira a vida de outra pessoa? Se não podemos matar os criminosos, então temos que manter para sempre presos os que são irrecuperáveis, ou temos que viver para sempre com medo deles? Existem criminosos irrecuperáveis? Todas essas questões precisam ser levadas em conta.
Espero ter ajudado de alguma forma.
Abraços,
André
Abaixo reproduzo o que escrevi no e-mail:
Cara Adriana,
Gostaria, inicialmente, de dar uma dica sobre a organização do trabalho: A pena de morte é um assunto para ser discutida em vários frontes distintos. Os principais planos de discussão seriam:
Plano jurídico: Seria a pena de morte permitida no Brasil? Essa pergunta tem uma resposta única e objetiva: Não, em vista do Art. 5º, XLVII, a) da CF/88. Mas nesse mesmo artigo se faz a exceção do caso de guerra declarada, desde que de acordo com lei a ser estipulada, conforme o Art. 84 da CF/88. Então, uma lei que instituísse a pena de morte para outros casos que não os de guerra declarada seria inconstitucional. Poderia ser feita uma emenda constitucional para fazer com que a pena de morte fosse permitida para outros casos? Não, em vista do Art. 60, §4º, IV, CF/88. Como a proibição da pena de morte é considerada uma das garantias individuais do direito à vida, é uma cláusula pétrea da constituição (quer dizer, uma daquelas normas que não podem ser reformadas nem mesmo por uma emenda constitucional). Conclusão: Pena de morte, no Brasil, para outros casos que não os de guerra declarada, só com outra constituição diferente da que aí está. No atual regime constitucional seria impossível, não teria lei, emenda, referendo, plebiscito que desse jeito nisso.
Plano da eficácia: Se, no entanto, a pena de morte fosse adotada no Brasil, ela funcionaria bem, no sentido de inibir a criminalidade? Aí vocês têm que examinar várias coisas. Em que países (ou, no caso dos EUA, em que estados) se adota a pena de morte? Nesses países (ou estados), quais crimes são punidos com a pena de morte? Quais requisitos precisam estar presentes para que o promotor público possa pedir "pena de morte" para o réu? Se condenado, em quanto tempo, em média, é executado? Quais são os meios de morte empregados? Houve efetiva diminuição da criminalidade depois da adoção da pena de morte? Quão parecidos ou diferentes do Brasil são esses países? Dadas as inclinações de nosso Congresso Nacional, quais seriam provavelmente os crimes punidos com pena de morte no Brasil? Dado o estado de nosso aparelho policial, judiciário e penitenciário, quem seriam as principais vítimas da pena de morte no Brasil? Será que ela seria uma medida eficiente mesmo?
Plano penitenciário: Nosso sistema penitenciário está falido. Temos um grande número de presos, um pequeno número de prisões, que se tornam superlotadas, violentas e deformadoras. São verdadeiras escolas do crime para os menos experientes e zonas de domínio e influência para os mais experientes. Muitos criminosos perigosos continuam a ser chefes do crime de dentro da prisão. Muitos saem e voltam a delinqüir. Nesse contexto, prender ainda adianta? Adiantaria se as prisões fossem em maior número e tivessem melhores condições? Mais ainda, essas prisões são dispendiosas, cada preso mantido lá custa caro aos cofres do Estado. Sendo assim, dever-se-ia gastar tanto dinheiro com essas pessoas, quando não se gasta com os que estão do lado de fora, trabalhando em vez de delinqüindo? Seria a morte um meio de reduzir esses custos e se livrar dos casos mais perigosos e irrecuperáveis? Temos o direito de fazer cálculo econômico de gastos ao tratar de vida e morte de seres humanos? A sociedade deveria empenhar todo tempo e dinheiro necessário na recuperação dos criminosos?
Plano moral: O Estado tem o direito de matar? Qual o objetivo da pena: punir, prevenir ou recuperar? Se for punir, a morte não é uma punição desproporcional, porque irreversível? Se for prevenir, de que modo a morte inibe de cometer crimes as pessoas que vivem constantemente sob a ameaça da violência e, portanto, também da morte? Se for recuperar, de que modo a morte haveria de recuperar alguém? Contudo, que punição seria proporcional ao crime que tira a vida de outra pessoa? Se não podemos matar os criminosos, então temos que manter para sempre presos os que são irrecuperáveis, ou temos que viver para sempre com medo deles? Existem criminosos irrecuperáveis? Todas essas questões precisam ser levadas em conta.
Espero ter ajudado de alguma forma.
Abraços,
André
Comentários
Aqui é a Adriana novamente; muito obrigado pela dica de estruturação do trabalho, mas o nosso trabalho tem um foque diferente: estamos coletando opiniões de pró e contra sobre a pena de morte, e se o senhor me mandar a sua opinião pedirei a autorização de citar seu nome no trabalho para apresentar o seu ponto de vista. Espero sua resposta, Obrigada!
Agora, isso é uma proposta para um trabalho escolar ou um projeto de monografia? (rs)
Não dá para esgotar o tema, tanto num quanto noutro. E é interessante em como esta postagem faz, dessa forma, uma crítica silenciosa (ou não) a qualquer pretensão de esgotamento das questões e debates a respeito da pena de morte.
Parabéns!
Ficarei grata se me deixar divulgar meu blog sobre Pena de morte aqui
todos podem deixar sua opinião lá sobre A Pena de morte, abaixo segue o link.
http://apenademorte.blogspot.com/2010/03/pena-de-morte-pro-ou-contra.html