Historia magistra vitae
Que a história é mestra da vida os antigos já diziam, mas a esse dito atribuíam um sentido político, instando os governantes a buscarem no passado as lições que os preveniriam contra os erros do presente. Até que ponto tinham razão sempre foi muito duvidoso, pois dependia de uma concepção circular da história a verdade daquela máxima e apenas com certa caridade se podia considerar aceitáveis as demonstrações dos filósofos de que esse ou aquele evento de seu tempo era a repetição deste ou daquele evento de passado mais remoto. Porque ver tal coisa dependia em grande parte de querer vê-la é que o famoso adágio, malgrado seu apelo sedutor ao espírito ilustrado, não pôde nunca ultrapassar as fronteiras bem guardadas do reino dos ensinamentos mais belos que verdadeiros ou, pelo menos, mais belos que comprovados. Há, porém, pelo menos um sentido em que a afirmação de que a história é mestra da vida é obviamente verdadeira, que é aquele em que se queira dizer que, para se formar clara ideia de quem é o homem, deve-se estudar o que ele já fez desde quando se tem notícia. Mas toda vez que se queira fazer disso mais que um truísmo banal, sugerindo que não há nada de novo sob o sol e que os homens agem hoje através dos mesmos meios e segundo os mesmos motivos que têm agido sempre em todos os tempos, começa-se a postular uma ideia unitária e imutável de natureza humana que as ciências humanas e sociais cuidaram de enterrar no cemitério das ideias superadas. Toda tentativa de reavivá-la não conta com mais chances de sucesso que os rituais de ressurreição dos mortos. Pode-se, sem dúvida, maquiar e animar um cadáver de modo que por um tempo se mova como se vivo estivesse, mas insuflar-lhe de volta a vida está além das possibilidades humanas reais.
Comentários
Quanto à ideia de que a falta de natureza humana comum tornaria as ciências humanas impossíveis, você pode ter querido dizer duas coisas: ou que a natureza humana é o objeto de estudo das ciências humanas, o que seria um equívoco, porque elas estudam fenômenos humanos que não precisam supor uma natureza humana universal e invariável; ou que, embora não sendo o objeto de estudo das ciências humanas, é a existência de uma natureza humana que torna possível constituir o humano enquanto objeto diferenciado e passível de estudo - o que está correto, desde que se atenha ao sentido modesto (pós crítica das ciências humanas e sociais) de natureza humana, e não ao sentido robusto que o humanismo clássico queria propor que se aceitasse.