Pausa para Desabafo: Dia da Mulher
Ter um dia da mulher é lembrança da desigualdade. Não há dia do homem, nem do branco, nem do rico, nem do chefe. É que ESSES são todo dia. Resumindo: Se ainda precisa haver um dia da mulher, é que o avanço na luta pela igualdade ainda não chegou aonde devia chegar. Aliás, haver um “dia de” alguma coisa é a melhor forma de não fazer nada a respeito dessa coisa e ainda assim parecer valorizá-la. O que deveria haver é algo assim como um programa que fiscalize o regime de contratação, de nomeação para cargos de chefia, que desmascare e puna a discriminação ali onde ela ainda acontece todos os dias. O que deveria haver é uma mobilização contra a dupla jornada de trabalho, uma campanha massiva pelos direitos iguais de crianças e adolescentes homens e mulheres e pela divisão equitativa de tarefas domésticas, denunciando que deixá-las apenas para as meninas e mulheres nada mais é que uma forma de escravidão doméstica por meios simbólicos. Isso, sim, seria uma bela iniciativa. “Parabéns” e uma rosa não compensam a discriminação diária, a escravidão doméstica, a violência simbólica, as barreiras duplas, nada disso. “Parabéns” e uma rosa são apenas uma forma de dizer que o ciclo da desigualdade hipócrita vai se renovar por mais um ano. É revoltantemente hipócrita dar “parabéns” e uma rosa para a mulher que não teve sua promoção porque é mulher, para aquela que é assediada no trabalho porque é mulher, para a mãe que precisa cuidar sozinha das crianças porque é mulher, para a adolescente que não pôde viajar com o namorado porque é mulher, para a menina que precisa lavar a louça depois do jantar porque é mulher. Essa é uma sociedade patriarcal, preconceituosa e excludente. Então, não me venham com “parabéns para elas que tornam esse um mundo mais…”, ah, vão pro inferno, vão!
Comentários
Já o dia da mulher é entregar uma flor hoje, talvez sair para jantar e amanhã tudo volta ao normal. O sentimento de valorizá-la é algo belo, sem dúvidas, mas a real consequência creio ser oposta: ontem(no dia das mulheres) fiz meu papel; amanhã(o resto do ano), tudo volta ao normal e sinto que não cometo nenhuma desigualdade, justamente pois no dia delas eu as respeitei.
Enfim, é a minha opinião, que concorda plenamente com o desabafo.
Leandro, li e reli o seu comentário e não consegui ver a parte em que você mostrou que estamos fazendo alguma coisa para eliminar as desigualdades remanescentes nem a parte em que você mostrou que dar rosas e bonbons auxilia no processo de assegurar iguais condições às mulheres. Ocorre que, sem ter mostrado nenhuma dessas duas coisas, o meu argumento basicamente se mantém intacto e a crítica que fiz, inteiramente pertinente. O que eu disse é que a suposta homenagem se faz acompanhar de uma aceitação passiva de desigualdades que ainda não fomos capazes de extirpar e que, se quiséssemos fazer algo realmente útil pelas mulheres, trataríamos de agir sobre elas. Agora, você tem algum argumento real contra essa tese em particular ou sua crítica ao meu desabafo se fundamenta em dizer que "no passado era pior, então vamos celebrar"?
Abraços.
Beijos.
Bárbara
P.S: faz pelo menos 7 meses que quero postar resposta ao artigo sobre o liberalismo que você escreveu e não arrumo tempo. Discordo fundamentalmente da divisão entre liberalismo ético e econômico.