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Pequeno Resumo de “Direito e Democracia”, de Habermas

Estrutura da Obra Habermas dedica a primeira parte da obra (caps. I e II) a explicar a tensão entre facticidade e validade e a metodologia crítico-reconstrutiva com que pretende abordá-la. Usa a segunda parte da obra (caps. de III a VI) para reconstruir a autocompreensão das ordens jurídicas modernas e configurar as várias manifestações da tensão interna entre facticidade e validade a partir de conceitos e teses da teoria do discurso. Finalmente, na terceira parte da obra (caps. de VII a IX) enfrenta o desafio de tornar a autocompreensão reconstruída do direito moderno plausível do ponto de vista empírico (com um modelo deliberativo de legislação e de esfera pública) e fornecer um diagnóstico do tempo com vista ao presente e ao futuro da democracia (com a ideia de passagem do paradigma social ao procedimental). Resumiremos agora as conclusões principais de cada uma das três partes da obra. Primeira Parte: Capítulos I e II O fio condutor da obra é a tensão entre facticida...

Regras Jurídicas e Sentido Literal

Pode-se dizer que uma regra jurídica tem um sentido literal? Se se pode, o que isso quer dizer? Como se determina o sentido literal de uma regra? Tal sentido depende do legislador, da regra, do intérprete ou da comunidade? Muda com o tempo ou é sempre o mesmo? Pode ser determinado em abstrato ou apenas em vista do caso concreto? Estas são algumas perguntas para as quais esta postagem pretende fornecer respostas preliminares, em linguagem acessível e de maneira introdutória, para uso de estudantes, professores e profissionais do direito. Para todos que queiram se aprofundar na questão, fornecerei uma lista de fontes ao fim da postagem [esta parte ainda falta fazer, mais tarde a completarei], com autores que concordam com minha posição e outros que a rejeitam veementemente. Pretendo defender uma versão do realismo semântico, isto é, da posição segundo a qual um texto tem um sentido literal, entendido como objetivo e metacontextual. A minha posição é bastante intuitiva, mas frequent...

Nem Prudencial Nem Egoísta: Uma Defesa do Argumento de Kant da Ajuda aos Necessitados

Esta postagem tenta mostrar que, ao contrário do que alguns críticos apontam, o argumento de Kant em favor do dever moral de assistência aos necessitados não se baseia em considerações prudenciais ou egoístas. Para isso, vou primeiro mostrar como o argumento funciona e depois distingui-lo em pontos cruciais da estrutura de um argumento prudencial e egoísta. 1. O argumento se encontra na Fundamentação da Metafísica dos Costumes . À altura do texto em que aparece, Kant já havia fornecido como teste de moralidade o imperativo categórico, formulado em termos de agir de modo que se possa querer que a máxima da ação seja tomada ao mesmo tempo como uma lei universal. Portanto, para saber se uma ação é moralmente correta, é preciso: (a) identificar a máxima que orienta a ação; (b) supor um mundo em que todos necessariamente agissem segundo aquela máxima; e (c) verificar se um mundo deste tipo é possível de (c.1) conceber sem contradição interna ou é possível de (c.2) querer sem que entre...

A legislação, a internacionalização e o fracasso da universidade brasileira

Excelente texto do amigo Thomas Bustamante, professor da Faculdade de Direito da UFMG. As maiores potências do mundo estão em crise e suas universidades estão perdendo cada vez mais cérebros. Na Europa e nos Estados Unidos, professores estão experimentando demissões, reduções de salários e cortes de financiamentos. Num contexto em que muitas universidades recorrem a empréstimos para fechar suas folhas de pagamento, jovens cientistas e pesquisadores têm cada vez menos oportunidades. No Brasil, por outro lado, nunca se investiu tanto na universidade e na ciência e tecnologia. A oferta de bolsas de estudo no exterior, inclusive para jovens nos primeiros períodos dos cursos de graduação, nunca foi tão generosa. Em valores nominais, a média dos salários pagos aos professores universitários na metade de suas carreiras (se forem doutores e em dedicação exclusiva) não está significantemente inferior aos pagos no Reino Unido e nos Países Baixos, por exemplo. Era de se esperar, com i...

Veto do Congresso a Decisões do STF: Reflexões Contemporâneas em Torno do Sistema de Freios e Contrapesos

Link para a notícia sobre a PEC aqui . Link para a notícia sobre a reação do STF aqui . - INTRODUÇÃO E ADVERTÊNCIA PRELIMINAR Nesta postagem pretendo discutir a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que submete decisões do STF em sede de controle de constitucionalidade e de súmula vinculante ao controle posterior do Congresso Nacional, que estaria autorizado a vetá-las. Esta proposta está atualmente em tramitação no Congresso e pode ser submetida a votação num futuro próximo. Minha intenção aqui é discutir se a proposta em questão, que seria uma inovação ao sistema clássico de divisão de poderes, representaria uma contribuição ao sistema de freios e contrapesos que mantém os órgãos de cada um dos poderes devidamente fiscalizados e controlados por outros órgãos de poder diverso ou diretamente pelos cidadãos. Verão que não me manifestarei a respeito da constitucionalidade desta proposta de emenda até o final da postagem, porque apenas no final minha posição a este respeito ...

10 Pontos sobre Paternalismo Estatal: Devemos Proteger os Indivíduos contra Si Mesmos?

Nesta postagem vou abordar o tema do paternalismo estatal e pretendo fazê-lo de forma resumida, com uma lista de dez pontos. Os pontos de 1 a 4 mostram qual o problema envolvido na questão do paternalismo e como defini-lo adequadamente. Esta parte da postagem é introdutória e situa o problema no contexto do Estado moderno, podendo ser considerada como mais ou menos incontroversa para quem quer que aceite o Estado Democrático de Direito, independentemente da ideologia política que se defende. Os pontos de 5 a 7 distinguem paternalismo de solidariedade social e mostram a que situações o conceito de paternalismo se aplica. Aqui se notará a vinculação de minha explicação ao ponto de vista do liberalismo igualitário, sendo o ponto 5 controverso para o libertário clássico e os pontos 6 e 7 controversos para os liberal compensatório e interventivo. Os pontos 8 e 9 afastam argumentos comuns em favor do paternalismo, um que associa liberdade à educação formal e outro que restringe a liberdade c...